Nós somos muito mais complexos do que imaginamos ser.
Podemos perceber o quão complexo somos com o “simples” fato de olharmos como se dá, de fato, o relacionamento humano.
Quando nos relacionamos com uma outra pessoa, seja numa amizade ou num namoro e até mesmo nos “ficas” que, infelizmente é algo tão comum hoje, não existe apenas uma troca de conhecimento de uma historia de vida, relacionar-se com o outro não é apenas saber do que esse outro gosta ou pensa, não é somente troca de carícias, abraço, beijo. O relacionamento humano vai muito mais longe, chega a uma dimensão que transcende.
Ao nos relacionarmos com um outro entramos numa comunhão tão profunda de vida que acabamos unindo ao outro tudo aquilo que temos; as nossas qualidades e também as nossas feridas.
Sim, é isso mesmo, nossas feridas acabam afetando o outro. É por isso que acabamos, muitas das vezes, ferindo o outro quando não queríamos.
Ao relacionar-se com uma outra pessoa as nossas feridas a afeta e, se esse alguém não tiver a maturidade necessária para saber lhe dar com as feridas desse outro, ela acabará se envolvendo com elas e acabará se ferindo com as feridas do outro.
É por isso que as feridas precisam ser curadas. Uma ferida aberta no passado que não foi curada será sempre uma ferida presente e viva, geradora de novas feridas.
O que mais me impressiona em Jesus não era a quantidade de milagres que ele fazia, mas era a sua capacidade de amar, de dar ao homem o que de fato ele precisava. As curas que ele realizava não eram, nenhuma delas, curas somente físicas, eram curas na alma, curas de um passado ferido.
Jesus sabia que somente a cura de uma alma, de uma história ferida, era capaz de fazer uma pessoa ser livre de verdade. E ele sabia que somente a verdade era capaz disso, de revelar a ferida com o objetivo de ser curada. Foi isso que ele fez com aquele paralitico entrevado há anos numa maca por causa de uma paralisia. Jesus não o cura, de imediato, fisicamente, mas ao dizer: “Os teus pecados estão perdoados.” Jesus realiza a primeira cura daquele homem e ela acontece na sua história, Jesus cura as feridas de sua alma e lhe dá a paz, somente após isso a cura física lhe é concedida. Uma alma, uma história ferida será sempre uma ferida que se revela no corpo, não adianta querer esquecer uma lembrança dolorosa, enterrar não é resolver, enterrar é guardar pra sempre algo que só trará sofrimento desnecessário.
Jesus sabia disso e a cura física daquele cego não foi com o objetivo de somente curar uma cegueira, mas essa cura se deu porque aquele homem precisava curar sua alma e essa cura só se daria se ele visse a verdade, verdade essa revelada nos olhos de Jesus. Por isso a cura física desse cego tem o objetivo de fazer com que aquele homem pudesse olhar, literalmente, olhar nos olhos de Jesus, porque somente assim, naqueles olhos, tudo seria revelado, tudo seria curado. Eram as feridas de sua alma, da sua história, que o cegava fisicamente. São as feridas de nossa historia, da nossa alma, que nos cega. Feridas que não nos permite ver a verdade e é por isso que a única coisa que pode resolver isso é a própria verdade.
Uma lembrança que atormenta e causa dor, uma lembrança que até nos causa indiferença é certeza de uma historia ferida e ferida não curada.
Curar o passado é curar o presente na perspectiva de um futuro livre, pois é descongelando o passado que se verá o rio da vida correr livremente sem barreiras que o impeça de seguir seu curso. Permitir-se curar numa historia dolorida é permitir-se viver uma vida verdadeiramente santa, pois não há santidade sem liberdade nem há santidade sem maturidade. E quer maior maturidade que CONHECER-SE e PERMITIR-SE ser curado?
(Texto escrito por Itamar Antônio)